sábado, 7 de maio de 2011


PÁGINA MARCADA

Marquei
no meu livro
a página de uma saudade
com uma flor
com o perfume guardado
dos versos
que agora li


Amélia de Morais

DÚVIDAS

Aonde levará
este estreito caminho?

O que nos aguarda
lá em cima?

Quando estarei
lá no alto?

Por que terei que subir
esta estranha escada?

Como saberei
se não subo?

Amélia de Morais


LOUCURAS II

Nem as Pirâmides do Egito
perdidas no Lago Ness
ou, em noite muito escura
a lua crescente em prece
Nada... nada mudará este frio
que meu corpo não esquece
senão a tua presença
que o teu corpo celeste aquece.

Amélia de Morais

TRAGICOMÉDIA


Entre cortinas
e luzes da ribalta
escondo a verdadeira face

Mas trago
exposta à gargalhada
uma face recortada
nos livros de tragicomédia

Entre as mãos
sob o meu silêncio
trago o sorriso que nunca tive

Mas guardo
no escuro da dor
um sorriso sombrio
recortado na face que nunca mostrei

Amélia de Morais

sexta-feira, 6 de maio de 2011



LAMENTO

Pra lamento
tenho unguento
à base de esperança

Na ponta da língua
uma canção
ou, ainda, uma oração

No gesto
a dança dos pés
o corpo faz o resto

Pra lamento
a luz acesa
sem medo de escuridão

Amélia de Morais



SEMPRE

É ter na mente
Éter na mente
Eternamente
Eterna mente...mente...mente...
Não sente...mente
Demente...mente
Secretamente...mente
Desmente...mente
Só mente
mente...mente...mente...eternamente

Amélia de Morais




ATÉ QUE A CERA DERRETA

Voarei por aí,
sobre mares e rios,
sobre prais, fazendas,
sobre prédios e casarios,
sobre estradas e sendas.
Voarei vendo o mundo,
seus montes e fendas,
o raso e o profundo.
Voarei lá no alto,
sobre horas, segundo,
sobre o teto e o asfalto,
até que a cera derreta
e eu caia no planalto
e então, seja poeta.

Amélia de Morais





TELA SEM COR

Tela sem cor
Diante de mim
Reclama pelo pincel

Mãos sem vontade
Diante da tela
Reclamam pela inspiração

O mundo girando
Ponteiros andando
O tempo passando

E a tela vazia


Amélia de Morais


ESTRADA

Cabelo ao vento
velocidade total
a vida passando veloz
uma curva
duas
três
e de repente anoiteceu
o que era doce
se acabou
ou não...não sei...
só vim aqui lhes dizer...

Amélia de Morais


VERSO EM VINHO

Um verso
esquecido
molhado no vinho
tinto e envelhecido
ressurge agora
novo e oferecido
quebrando o ovo
deixado no ninho

Amélia de Morais




ONDE?

Onde estás?
Em que país,
em que galáxia?
Em que momento,
em que instante?
Em qual oração,
ou só falácia?
Em que sorriso,
em que semblante?
Em que sonho
em que fantasia?
Em que sabor
em que aroma?
Em que hora
da noite ou do dia?
Em que raiz
em que rizoma?
Onde estás
que não encontro?
Nas veias da imaginação
ou nas ruas da escuridão?

Amélia de Morais


AH, SAUDADES!!

Misteriosa e complexa,
vilã e companheira,
a saudade vem anexa
à paixão pura e verdadeira

Também se une ao amor,
assim como à amizade,
machucando como dor
ou consolando, com bondade

Ah, saudade da minha terra!
Saudades do meu pai, do meu irmão!
Saudade que em si encerra
desterro ou abolição


Amélia de Morais


TEMPERANÇA

Um olhar passou e me arrastou
Conheci os mistérios do amar, amando
entre o frio e o calor

Um vento passou e me levou
Conheci os mistérios do ar, voando
entre a saudade e o amor


Amélia de Morais



PELE CLARA

Pele clara
da clara manhã
da nova manhã
pele lisa aveludada
as horas pra ela
não pesam
mas há de chegar a tarde
e com ela
a pele manchada
as rugas
no canto da boca
que então, não canta mais
sem tempo pra nada
as horas passam velozes
e a noite
pele enrugada
contará histórias
de pêssegos
colhidos na clara manhã
de pele clara

Amélia de Morais



FADA ESCADA
(Para Kinda)

Fada, fadinha
amiga minha
de longa distância
confortável estância

Fadinha, fada
minha amiga
sinta-se abraçada
na minha cantiga

Fadinha amiga
minha fada
meu peito já abriga
os passos firmes dessa Escada


Amélia de Morais

ECO II

O sangue seco
na camisa
e a faca no coração
Partiu
ouvido o eco
do corte
e da queda do corpo
no chão
Partiu
deixando incompleta
a letra
do samba-canção

Amélia de Morais

PAUSAS PARA VIVER

Pausa para sonhar
Os sonhos de todas as cores

Pausa para escutar
Os sons dos nossos tambores

Pausa para sorrir
Das belas histórias de amores

Pausa para sentir
O perfume de todas as flores

Pausa para compor
Canções de esquecer as dores

Pausa para repor
A beleza dos arredores

Pausa para viver
A vida sem os rancores

Pausa para romper
O tempo e seus temores


Amélia de Morais
NOSSA CHUVA

Sou toda olhos
Sou toda mãos
Sou toda sorte

Entregue-se ao inevitável
Atire-se no improrrogável
Aceite o inadiável

Minha alma – seu perfume
Sua pele - meu lume
Nossa chuva sem queixume


Amélia de Morais

quarta-feira, 4 de maio de 2011



QUEM TEM UM POETA AMIGO

Quem tem um poeta amigo
leva o verso consigo

Traz a poesia como abrigo
quem tem um poeta amigo

Quem tem um poeta amigo
tem o pão sem o castigo

Separa o joio do trigo
que tem um poeta amigo

Quem tem um poeta amigo
trouxe a sorte no umbigo

Garante o epitáfio no jazigo
quem tem um poeta amigo


Amélia de Morais


A MÃO E O BOTÃO

Lá vem ela novamente
sua pele acariciar
com seus dedos envolventes
arrancando da flor, ainda botão
pequenos suspiros
espalhando suas pétalas pelo chão

Amélia de Morais




FEIRA LIVRE

Acordei bem cedinho
fui à feira dos prazeres
uma sacola de linho
pra guardar os bem quereres

Andei devagarzinho
escolhendo com cuidado
olhava de pertinho
separando os meus agrados

Primeiro foi o sossego
macio e aveludado
parecia um fresco pêssego
pedindo pra ser levado

Depois um bom livro
de um autor já conhecido
pareceu-me bem no tom
do sossego já escolhido

Em seguida,um lindo espaço
destes bem iluminados
cercado por um terraço
e árvores por todo lado

E por fim, porque a idade obriga,
uns óculos para a leitura
simples e de boa liga
que uns bons anos atura

Voltei pra casa feliz
andando mais rápido agora
ansiosa como uma aprendiz
mas discreta como uma senhora

Meu maior prazer, por um triz.


Amélia de Morais


O SOL NUNCA MORRE

Estrela
que guia o dia
Estrela
que norteia a noite
Vive de dia
vestida de sol
Vive de noite
vestida de lua

Amélia de Morais




BOCA DA NOITE

Na boca da noite
estrelas alimentam
nossos sonhos de poeta

Amélia de Morais


ESCOLHAS

Uma voz ecoa no escuro
como quem busca um escutar
uma sombra dança sobre o muro
como quem quer um novo par
uma mão cata um futuro
como quem sonha voar
Outra mão, um fruto maduro
como quem ousa pecar

Amélia de Morais


CRIANÇA

Criança
seria assim
andança
pelo jardim
lambança
sobre o capim

Criança
seria danada
confiança
na meninada
esperança
em tudo e nada

Criança
seria um país
liderança
na ponta do giz
mudança
pra ser feliz


Amélia de Morais


DISTANTE DAS MINHAS MÃOS

Tão longe dos meus olhos,
distante das minhas mãos

Me perco em devaneios,
me encontro na solidão

Por onde andas, minha saudade,
que não me tens no seu coração?

Onde estás, minha mocidade,
que não ouves minha canção?

Amélia de Morais



A ARTE DA POESIA

Poesia é tudo e nada,
o beijo da namorada,
o adeus na noite calada.

Poesia é nada e tudo,
na rosa, o seu veludo,
o espinho que fere mudo.

Poesia é rompante e suor,
dos males, o menor,
remédio pra mal de amor.

Poesia é suor e rompante,
escrita certa de letra errante,
papel amassado de iniciante.

Poesia é mentira e verdade,
às vezes birra, às vezes amizade,
a dor fingida da fidelidade.

Poesia é verdade e mentira,
às vezes sofre, outras, delira,
metade homem, metade curupira.

Poesia não se come, não se cheira e é invisível,
mas é concebível.
A tela é sua, faça-a possível!


Amélia de Morais


AMANHECER

Escuta a manhã chegar
vem de mansinho, pequena
surgindo da noite escura
pra se tornar clara e plena

Escuta, presta atenção
na música sutil dos seus passos
que vai explodir de repente
com o sol lhe roubando um abraço


Amélia de Morais


VOANDO NA SUA CANTIGA

Quero levar o vento
que trazes no catavento
soprar pra longe todo tormento
viver de brisa, suave e lento

Quero voar na sua cantiga
firme elivre na mão amiga
rir do seu riso e na fadiga
dormir no sopro que abriga


Amélia de Morais


ÁGUAS VAZANTES

E ouço cantar o vento
sinto seu cheiro no ar
agora não é mais tempo
de viver o que não há
os versos que ouvia antes
trazidos na minha memória
são vozes de águas vazantes
perdidos nos vãos da história
E o vento chora nesse instante

Amélia de Morais
(tela de Jennifer-Goldberg)

REVELAÇÃO

Quero me revelar
inteira e sincera
em partes mostrar
que sou bela e fera

Pretendo exibir
o lado mais obscuro
pra depois me colorir
com cores que misturo

E posso também mostrar
o quadro que sou e pinto
às vezes posso falar
às vezes apenas sinto

Amélia de Morais


POEMINHAS DA MADRUGADA

I
Uma estrela brilhante
na noite sem fim
cadente, num rompante
caindo dentro de mim

II
As flores desse jardim
plantadas no meu peito
exalam como o jasmim
aroma de amor refeito

III
Sonho dormir assim
no perfume desse leito
nas mão de um querubim
macios lençõis desfeitos


Amélia de Morais
(Namorados Ismael Nery)

INTENSA LOUCURA

Corre no meu peito
uma coragem imensa
de viver sem causa e efeito
uma loucura intensa

Viver a noite e o dia
sem medo, nem recompensa
pelo prazer que arrepia
de estar na sua presença

Viver em cada estação
todo instante de avença
sem a menor aflição
de uma alegria pretensa


Amélia de Morais


HISTORIETA

A música me abraça
me joga nos seus braços
me envolve nos seus sonhos
me devolve o amanhã

E a manhã?
andarei muitas braças
pegarei várias barcas
para abarcar nosso sonho
e embarcar nessa história


Amélia de Morais



POETA OU FARSANTE?

O céu é perto
e é distante

O tempo é sempre
um só instante

O sol pequeno
é um gigante

O mar agita
e é calmante

a Terra gira
sem volante

O fogo arde
crepitante

O verso pobre
é aspirante

O verso rico
confiante

Eu sigo em frente
viajante

Sou poeta
ou farsante?


Amélia de Morais


CANÇÃO ÀS ESTRELAS

Vocês ficam aí, quietinhas,
brilhando na escuridão,
num silêncio de timidez,
inspirando nossa canção.
Ficam aí, infinitas,
fingindo que são pequenas,
enfeitando nosso sonho
de sermos assim tão bonitas!

Amélia de Morais

terça-feira, 3 de maio de 2011



ENTRE O CHAPÉU E O SAPATO

Sigo cantando
e plantando sementes
sigo dançando
cada sol nascente
entregando meu sorriso
buscando mão amiga
ando meio sem juízo
sem o verso da cantiga
mas sigo voando
entre sonhos e fatos
entre o real e o teatro
entre a língua e o palato
entre o chapéu e o sapato

Amélia de Morais



BILHETE PERDIDO, ENCONTRADO

Palavras, palavras, palavras
que dizem e escondem
e não traduzem o inseguro
sentimento ausente na sua boca
porque és corpo, não alma
e me oculto de mim mesma
no jardim secreto do amor-não-declarado
e brinco de esconde-esconde
nas entrelinhas das palavras
que não digo e finjo escutar

Amélia de Morais


SAGRAÇÃO

São versos sagrados
consagrados à água
consagrados à terra
consagrados ao fogo

São versos, legados
da melodia que vem do mar
da palavra que brota do chão
das cores que emanam do sol

São versos bordados
da energia que circula no universo
da força que gira no mundo
da certeza que nasce da fé


Amélia de Morais


A MÚSICA NA MINHA CABEÇA

A vida passava por mim
a música na minha cabeça
o vento cantava pra mim
pra mim, menina travessa
o gato sorria pra mim
Alice em terra avessa
A lua brilhava pra mim
não é que você não mereça
o mar falava de mim
que fale, mas não me esqueça
A nuvem guarda pra mim
um canto pra que eu adormeça
o sono não chega pra mim
espero que amanheça
a vida, ela por mim
a música na minha cabeça
não cessa, confessa...
promessa...

Amélia de Morais


CANSAÇO

Meu corpo pede colo,
pede seda, pede alma
meu corpo pede consolo
pede descanso, pede calma

Meu corpo, copo quebrado
pede cola e abraço
meu corpo, meio alquebrado
pede no teu, um espaço


Amélia de Morais


POESIA DA VIDA INTEIRA

Dorme nos meus braços
a força que um dia tive
e sobre os meus pés
a dança que um dia fiz

Dorme na minha cabeça
a memória imediata
e no meu rosto
o sopro da juventude

Dormem sobre o papel
as dores da vida inteira
descritas com discrição
nos verso da minha poesia

Amélia de Morais


POESIA II

A essência
com que perfumas
minha mão
é o que preciso
pra seguir versando

Amélia de Morais



(Tela Mulher musa - Salvador Dali)


PRECONCEITO

O homem feriu o homem
com a força da palavra
com a forca da exclusão
com a faca do desprezo

Um pensamento podre
habita na rede de insultos
o homem cortou o laço
e o sangue cobriu esse espaço

Meu umbigo chora.


Amélia de Morais


NOSSOS ERROS

Nossos erros
são flechas atiradas
sem mira, sem visão.

São serros
vincados nas faces
dos dias que ainda virão.

Nossos erros serão
os calos das nossas mãos,
a nossa história escrita
que o tempo não nos credita
e o homem não acredita,
desdita, evita,
enjeita, rejeita
e vomita.

A lágrima na solidão.


Amélia de Morais


TEMPO DE ANJO

Um anjo pairou no ar
suspenso na eternidade
como que meditando...

Quando o tempo dormiu
às portas da madrugada
o dia foi noite tão somente...

E o anjo sonhou ser gente


Amélia de Morais


SEM VISÃO

E os cegos
tapam seus ouvidos
e engordam sua escuridão,
agarram-se às paredes
das sombras
e ali permanecem
tatuados
até que se apaguem
ao longo do tempo,
sem histórias pra contar.
E o sol brilha lá fora
lindo,
livre, livre, livre...

Amélia de Morais