
Numa grande ciranda
ao redor do mundo
quem sabe a criançada abranda
a dor que cala profundo
o lado que nada manda
e limpa o corpo imundo
que comanda a outra banda
Amélia de Morais
.
ENTRELINHAS REVELADAS
.
Vou lhes contar um segredo
Que guardo na palma da mão
Nos dedos curtos de herança materna
Na alma poética de herança paterna
Não sou poeta, não
Fazer versos é só um brinquedo
Que ganhei ainda menina.
Eu sempre quis ser dançarina,
Mas um vento atrevido
E me soprou no ouvido
Que o mundo é muito maior
Nas páginas de um livro versador
Desde então, danço com a poesia
Mas sou apenas sua companhia
Amélia de Morais
.
.
Nada de virar a página
sem ler o que nela está escrito
nada de aplicar a pátina
sem raspar as sobras, detritos
Nada de comprar a briga
sem entender o motivo da confusão
nada de fazer intriga
nem apontar o dedo em acusação
Nada de deitar na cama
se o sucesso é efêmero, é fugaz
Nada de criar um drama
as bruxas, elas não são más
Nada de dormir pura e simplesmente
os sonhos são a vida ainda em semente
Amélia de Morais
Ah, porque me sinto
como quem quer um abraço,
o mundo inteiro abraçaria
e convidaria pro passo.
Ah, porque me sinto
como quem quer um carinho,
em todos eu tocaria,
nem toda flor tem espinho.
Ah, porque me sinto
como quem quer uma canção,
pros amigos eu cantaria,
soltando voz e emoção.
Ah, porque me sinto
como quem quer um conselho,
aos amigos eu ouviria
a agradecer de joelhos
Ah, porque me sinto
como quem quer uma graça,
ao meu Deus eu me dirijo:
Senhor, abençoada me faça!
Amélia de Morais
Joguei, sim,
joguei sementes de estrelas no mar,
joguei sementes de liberdade no amor,
joguei sementes de vida na água,
joguei sementes de canção no samba.
Criei um mundo melhor,
sem água-furtada, após-guerra,
baixo-astral, caça-níqueis,
dedo-duro, franco-atirador,
má-educação, puxa-saco,
e sem -vergonha.
Um mundo pós-reforma literária.
Amélia de Morais
Ninguém me falou
Ninguém me falou
que o amor doía,
nem do coração.
Ninguém me falou
desta tal de razão,
que a gente sofria.
Ninguém me falou.
Acaso alguém me explicou que o amor é portátil,
que a paixão é volátil,
acaso explicou?
Ninguém me falou que ausência é saudade e chegada, euforia.
Por pura maldade ou desconhecia?
Amélia de Morais